Do site da Crescer
"A presença do pai é fator cientificamente comprovado no crescimento e desenvolvimento emocional, cognitivo e de linguagem na infância, com o fortalecimento do vínculo, protegendo a criança em seu desenvolvimento físico e psíquico e contribui para diminuir, por exemplo, a incidência de depressão pós-parto e burnout maternos", alerta o pediatra, em sua coluna, ao defender o aumento da licença-paternidade "já"
por Dr. Moises Chencinski - colunista
22/10/2025
Durante o “Agosto Dourado”, mês dedicado à conscientização sobre a importância do aleitamento materno no Brasil desde 2017, tive a felicidade de abordar o tema em muitas cidades e muitos serviços de saúde do país. No total, entre presencial e online, participei de 23 atividades em que pude abordar alguns temas a respeito da amamentação, especialmente sobre a temática da 34ª Semana Mundial de Aleitamento Materno (Priorizemos a Amamentação: Construindo Sistemas de Apoio Sustentáveis), sobre a influência do Marketing Digital na Amamentação e informações que eu gostaria que tivessem me contado antes a respeito da teoria e da prática do padrão ouro da alimentação infantil, o Leite Humano.
Abordei questões de legislação e da realidade brasileira da licença-maternidade que varia de 6 meses (180 dias), para mulheres que trabalham em Empresas-Cidadãs e alguns órgãos públicos, 4 meses (120 dias) para mulheres com empregos formais ou que, comprovadamente, contribuem para a Previdência Social até ZERO DIAS para grande parte (cerca de 37%) das mulheres que trabalham na informalidade, ou seja, sem vínculo empregatício.
E no meio dessas conversas, falei muito a respeito de uma situação que também traz repercussões na amamentação, mas usei um termo que, ao mesmo tempo que chocou algumas pessoas, provocou risos pela forma de abordagem. É o famoso: “seria cômico se não fosse trágico”. Como fica o pai nessa situação? Ele tem 5 dias de “ESMOLA-PATERNIDADE”. São 5 dias corridos (não dias úteis) de licença, paga pela empresa, para que ele fique em casa e dê apoio e conheça seu filho. Já em Empresas Cidadãs a “ESMOLA-PATERNIDADE” aumenta para 20 dias.
E cheguei a comentar que, a iniciativa de projetos de lei para que essa “esmola” aumentasse para 30 dias, ainda era um movimento muito, muito, muito sutil para que se atingisse a intenção de que o pai pudesse realmente ser rede de apoio para sua família, exercesse a parceria e divisão de responsabilidades e criasse uma possibilidade de vínculo e do sentimento de paternidade em relação ao recém-nascido.
Pois eis que hoje fui “surpreendido” por uma postagem em Facebook, no Instagram sobre a quase aprovação da extensão da licença-paternidade para 30 dias.
Aliás, abrindo parênteses, uma postagem que foi descuidada, sem nenhum capricho, quase amadora (tem uma agência que recebe para fazer esse tipo de trabalho, que certamente não passou por revisão?). Com a intenção de mostrar a “divisão de responsabilidades” aparecem, no vídeo, duas imagens:
A primeira imagem mostra um pai dando mamadeira para um recém-nascido, deitado, virado de lado (o que favorece imensamente engasgos e otites – não acredito que o post tenha passado por revisão de profissionais de saúde). A imagem a seguir é de outro pai também oferecendo mamadeira para um bebê um pouquinho maior. Qual a intenção dessa sequência? PROMOVER E ESTIMULAR O DESMAME? Normalizar o uso de mamadeiras? Esse é o apoio que se espera de um pai visando a saúde de seu bebê? Por que razão não divulgaram uma mãe amamentando e o pai, em outras tarefas (lavando louça, arrumando a cama, cozinhando ou até trazendo água para essa mãe ser hidratada no processo do aleitamento, são tantas possibilidades...), compartilhando esse momento em família?
A presença do pai é fator cientificamente comprovado no crescimento e desenvolvimento emocional, cognitivo e de linguagem na infância, com o fortalecimento do vínculo, protegendo a criança em seu desenvolvimento físico e psíquico e contribuem para diminuir, por exemplo, a incidência de depressão pós-parto e burnout materno.
Voltando ao que me motivou a escrever esse texto, vou utilizar um dos ditados mais adequados para esse momento: “Quando a ESMOLA é demais, até o santo desconfia”. Vamos ao que foi exposto na postagem assinada pelo poder público.
Sim, a licença será estendida para 30 dias, masssss, e sempre tem um massss... com um cronograma. A ESMOLA-PATERNIDADE será de:
Em 2025 - 5 dias.
Em 2026 - 5 dias (ainda).
Em 2027 - 10 dias.
Em 2028 – 15 dias.
Em 2029 – 20 dias.
Em 2030 – 25 dias.
Em 2031 – 30 dias.
Isso mesmo. A esmola continua a mesma em 2025 e 2026 e terá 5 dias de aumento por ano, a partir de 2027 e em 2031, finalmente, chegará a 30 dias. Só para lembrar teremos eleições em 2026 e 2030. Ou seja, a esmola ficará completa daqui a 2 eleições.
Essa despesa que era da empresa passará a ser paga integralmente pela Previdência Social. Mas, diferente do que aparece no vídeo, onde dizem que essa situação já vai acabar, nem já, nem já já. Só em 2031.
A recomendação da Organização Mundial de Saúde (que eu já abordei tantas vezes aqui) não mudou:
ALEITAMENTO MATERNO DESDE A SALA DE PARTO ATÉ DOIS ANOS OU MAIS, EXCLUSIVO E EM LIVRE-DEMANDA ATÉ O SEXTO MÊS.
Em países que se preocupam com a saúde materno-infantil, que analisam a importância e a relevância da presença dos pais, independentemente do gênero do casal, se discute a licença parental, ou seja, a licença remunerada, com retorno ao emprego garantido, para pai e mãe trabalhadores, que se seguem à licença-maternidade e paternidade quando essas terminam, chegando a 2 anos, em algumas localidades.
A Suécia tem um total de 480 dias de licença parental remunerada. No Japão, os pais têm acesso a uma das licenças mais generosas (52 semanas), em um esforço para diminuir a potencial discriminação por parte do empregador, fortalecer os laços familiares e aumentar a equidade de gênero em casa e no local de trabalho.
Até 2019, não tínhamos atingido nem 50% das crianças abaixo de 6 meses em aleitamento materno exclusivo e a proposta da OMS é de 70% em 2030. A sobrecarga materna é imensa. E quando aparece uma chance, uma oportunidade de se trazer uma luz sobre essa situação, a sensação é que a luz é de uma vela, láááááááá no final do túnel. Em 2031. Será que essa chama da vela permanecerá acesa até 2031?
Mesmo que seja essa proposta inadequada, insuficiente, de 30 dias, precisamos dessa licença-paternidade já.
Dr. Moises Chencinski - CRM-SP 36.349 - PEDIATRIA - RQE Nº 37546 / HOMEOPATIA - RQE Nº 37545