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Como se preparar para a amamentação?

Do site da Crescer

"Informação profissional, ética, atualizada e sem conflito de interesse é a chave. Isso garante uma amamentação perfeita e sem desafios? Não, mas ajuda muitooooo", diz o pediatra Moises Chencinski sobre as alterações e adaptações feitas em prol da amamentação

por Dr. Moises Chencinski - colunista

30/04/2024

Reflexões de hoje:

- Como você se planeja para cada segunda-feira?
- Quando você começa a se organizar para o final de semana? E para as férias?
- Já parou para pensar em como você elabora seu dia de trabalho? E sua vida?

Pode até ser que você seja aquele tipo de pessoa que deixa tudo para a última hora, ou que acredita que de alguma forma “as coisas vão se resolver”.

Então, possivelmente, você não está pensando como uma mãe ou a maioria das futuras lactantes. Dentro do vocabulário e do imaginário de uma gestante, ou até na elaboração desse “projeto”, as palavras “imaginar”, “idealizar”, planejar”, programar”, “organizar”, “preparar”, “estruturar”, “articular”, “detalhar”, entre muitas outras, são frequentemente utilizadas ou, pelo menos, muito pensadas.

E, dependendo de alguns fatores, isso pode até se tornar uma obsessão ou uma necessidade. Não podemos nos esquecer que a “responsabilidade” sobre muitos, para não dizer quase todos, os acontecimentos da gestação, parto, amamentação, cuidados pesam, quase que exclusivamente, nos ombros da mulher.

Mas e a rede de apoio? Pois é! E a rede de apoio? Na maioria das vezes, dá pra contar nos dedos de uma mão as mulheres que contam com uma rede de apoio suficiente e atuante para compartilhar e “dessobrecarregar” (termo novo).

E isso, sem contar tudo o mais que seria essencial para o “sucesso”: leis, um sistema de saúde acolhedor para todas as mulheres e crianças, empregos, informação...

Essa pequena e singela introdução é para que fique claro que a amamentação também requer uma preparação e que ela não deveria depender unicamente da mulher.

Maaaaasssss... vamos imaginar, em um mundo ideal ou, pelo menos, sem as questões sociais, econômicas, laborais, o que uma mulher precisaria para se preparar para amamentar? Será que ela pode ou consegue deixar tudo para a última hora ou que acredita que de alguma forma “as coisas vão se resolver”?


Quando começo, ou deveria começar, esse preparo?

Uma gestação mereceria ser programada. Sabemos que muitas vezes ela acontece sem uma previsão, sem planejamento. Mas, mesmo nessa situação, há ações que podem ser tomadas para evitar problemas e favorecer a amamentação.

Para que o aleitamento materno aconteça, é necessário que a dupla mãe-bebê ou lactante-lactente esteja com boa saúde. E isso não começa na gestação. Vale reforçar a importância de uma vida toda com cuidados na alimentação, vacinação, atividades físicas, contato “íntimo” e constante com a natureza, atenção à saúde mental, emocional, lazer... Pois é, viver parece ser mais trabalhoso do que “apenas” respirar, ter o coração batendo, o intestino funcionando e pensar.

Recorte Brasil: Gravidez na adolescência

Dados do Ministério da Saúde mostram que em 2.020:

- 380.000 partos aconteceram em jovens até 19 anos (14% do total).
- 1.043 adolescentes se tornaram mães por dia – 44 partos por hora.
- 2 desses partos são na idade de 10 a 14 anos.
- No recorte racial: 
  * Entre as mães indígenas – 28,2% eram adolescentes.
  * Entre as mulheres pardas – 16,7%.
  * Entre as mulheres negras – 13%.
  * Entre as mulheres brancas – 9,2%.

No Brasil, de 1 a 8 de fevereiro é a Semana Nacional de Prevenção da Gravidez na Adolescência, instituída em 2.019 (Lei nº 13.798).

Como nem sempre a gravidez é planejada, é importante que toda mulher em idade de engravidar (assim, infelizmente na nossa realidade, a partir dos 10 anos) tome uma suplementação de ácido fólico diariamente, o que reduz em até 93% as malformações do tubo neural (futura medula espinhal) do bebê. Já em caso de gestação programada, o ácido fólico deve administrado de 3 meses antes de engravidar até o terceiro mês de gravidez, quando o tubo neural já está formado.

Até por essa questão, a vacina de HPV é recomendada para meninas e meninos já a partir de 9 a 14 anos. O SUS disponibiliza essa imunização (HPV-4), agora em dose única, de acordo com o Programa Nacional de Imunizações (PNI). A SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações) recomenda a vacina HPV-9, em duas doses.

E essas orientações devem estar presentes nas consultas de rotina, desde o pediatra, passando pelas consultas ginecológicas e chegando ao pré-natal, com acompanhamento regular durante toda a gestação, incluindo uma com pediatra, a partir da 32ª semana de gestação, muito importante para esclarecimento de dúvidas e orientações básicas, mesmo antes de o bebê nascer.


Falou, falou, falou, mas... e a preparação para amamentar?

Muitas orientações e recomendações mudaram através dos tempos, pelos estudos científicos, pelas pesquisas e algumas ainda são mantidas.

O que não “se usa” mais?

- Preparar o seio para amamentação: O seio se organiza sozinho, através de sua evolução hormonal, fisiológica. Não precisa mais passar a buxinha, raspar ou massagear o mamilo para que ele fique mais resistente. A pega não é no mamilo. Se a pega for no mamilo, não existe nada que proteja de dor, fissura, rachaduras. A pega é na aréola. E uma boa pega pode ser aprendida antes do parto.

Ainda nessa mesma linha, não se lava mais a mama (aréola incluída) com sabão ou qualquer produto, não se usa laser para prevenção de rachaduras (ou para aumentar a produção de leite), não se recomenda conchas ou protetores de mamilo de rotina, não se passa pomada, lanolina, hidratante, cremes. A aréola conta com uma hidratação e proteção natural produzida por glândulas (de Montgomery) que estão ali e que não deve ser retirada.

- Puxar o mamilo para facilitar a pega: alguém disse (devia ser um homem), algum dia, em algum momento (na verdade em 1.953), que puxar o mamilo e girá-lo com o dedo (manobra de Hoffman - colocar o polegar, ou os dedos indicadores, próximos ao mamilo invertido, e gradualmente empurrar os dedos afastando-os da aréola”... arghhhhhh) ou com a ponta de uma seringa umedecida e puxar com o êmbolo por um minuto, várias vezes ao dia (outro homem), ajudaria a “corrigir” mamilos invertidos e favoreceria a pega. Além de a pega é na aréola... prefiro não comentar. Mas não, tá?

- Não pode amamentar deitada: você já percebeu que, independentemente da posição que a mãe amamente, a criança, que é quem mama, está, na maioria das vezes (menos quando está sentadinha – a cavaleiro) deitada? Então, quem muda de posição é sempre a mãe. O bebê está sempre na mesma posição. E existe alguma posição melhor para a mãe amamentar? Siiiiimmmmmm. Existe. É aquela em que mãe e bebê estão mais confortáveis, seguros e próximos. E isso pode variar com a idade do bebê.

- Engravidou enquanto amamentava? Precisa parar de amamentar: “a liberação da ocitocina durante a mamada pode provocar contração uterina e abortamento”. A liberação de ocitocina durante um orgasmo é mil vezes maior do que em uma mamada. Alguém de vocês já recebeu a orientação para não ter orgasmos durante a gestação? Acho que não, né? Assim, a lactogestação (amamentar o bebê mais velho durante a gravidez) e depois a amamentação em Tandem (amamentar os dois bebês – o recém-nascido e o mais velho – ao mesmo tempo) são decisões da mãe, com informação dos profissionais de saúde que cuidam da díade. A mãe informada decide. Sempre. Ela é a protagonista da amamentação.


Mas então, o que prepara a mãe para a amamentação?

INFORMAÇÃO PROFISSIONAL, ÉTICA, ATUALIZADA E SEM CONFLITOS DE INTERESSE É A CHAVE.

Isso garante uma amamentação perfeita e sem desafios? Não, mas ajuda muitooooo.

As janelas de oportunidades acontecem durante a gestação, na maternidade, nas consultas de rotina com profissionais de saúde materno-infantil (puericultura com pediatra que conheça e seja habilitado e capacitado em aleitamento materno, aconselhamento, observação da mamada – mesmo que aleitamento materno não seja, até agora, uma especialidade ou uma área de atuação da Pediatria – mas deveria).

A respeito de cuidados com as mamas, para a gestação, lavar o seio só com água, usar sutiãs confortáveis (alça larga, boa sustentação, de algodão, sem suporte de ferro, com fecho regulável – lembre-se que as mamas aumentam demais de volume nesse período). 

E a respeito da amamentação, INFORMAÇÃO, vale a recomendação básica da OMS, do Ministério da Saúde, da Sociedade Brasileira de Pediatria e muitas outras instituições (e até eu rsrs):

- Aleitamento materno desde a sala de parto: fazendo parte da hora dourada (Golden Hour – com clampeamento oportuno de cordão e contato pele a pele).
- Até dois anos ou mais: quem define o desmame é a díade mãe-bebê, no momento oportuno (amamentação prolongada?).
- Exclusivo e em livre demanda até o 6º mês de vida: sabe aquela “recomendação” de oferecer de 3 em 3 horas, 10 minutos de cada lado? Isso já faz parte da história, do passado. Agora, quem determina intervalo, duração, um ou dois seios por mamada, é a dupla lactante-lactente.

Preparada? Totalmente? Não, né?

Se as coisas não saíram como planejei posso ficar feliz por ter hoje para recomeçar”.
Atribuído a Charles Chaplin.

Dr. Moises Chencinski - CRM-SP 36.349 - PEDIATRIA - RQE Nº 37546 / HOMEOPATIA - RQE Nº 37545