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Da desromantização à normalização: uma corrida de obstáculos

09/06/2023

É desafiador manter o equilíbrio, meta da maioria das pessoas.

Podemos tentar transitar entre o dicionário, a literalidade da palavra fria, o imaginário, através das emoções, e, mesmo assim, o equilíbrio nem sempre aparece e, se é atingido, pode durar a infinidade de um segundo.

Mesmo as definições que encontramos no dicionário de EQUILÍBRIO apresentam bases distintas para explicar esse equilíbrio entre a concretude e o impalpável. . Olha isso, da mesma fonte:

- Estado de um corpo que é influenciado por duas ou mais forças que se anulam entre si; que se mantém sem se inclinar para nenhum dos lados; posição estável; igualdade entre forças opostas.

- Proporção harmoniosa; estabilidade emocional e mental; autocontrole; sem exceder para mais ou para menos; moderação nos gestos, modos, palavras, sentimentos etc.; prudência.

Se a definição já requer tanta explicação, dá para imaginar a atitude e a ação. Quem acompanhou a história do Rei Leão (filme) talvez se lembre de uma frase dita por Mufasa para Simba, sobre o ciclo da vida:
Tudo o que você vê faz parte de um delicado equilíbrio. Como rei, você tem que entender esse equilíbrio e respeitar todos os animais, desde a formiguinha até o maior dos antílopes”.

O que para uns é bom, para outros pode não ser. Aquilo que é adequado hoje, pode não ter sido ontem. E quando pensamos no “ser humano”, com todas as questões envolvidas (sociais, culturais, econômicas, biológicas, de gênero, idade, raça entre muitas outras)?

Atingir o equilíbrio. Depois se manter em equilíbrio. E isso em um mundo que se transforma constantemente. É como disse Albert Einstein, na adaptação de um trecho de carta que escreveu ao filho Eduardo, em fevereiro de 1930:
Viver é como andar de bicicleta. É preciso estar em constante movimento para manter o equilíbrio.”

E mesmo assim, se no meio do caminho aparece uma pedra, se tem uma pedra no meio do caminho (Drummond, Drummond), há sempre o risco de cair e se machucar, mesmo sendo um ciclista experiente e atento.

Da introdução à amamentação

O aleitamento materno existe desde que o mundo é mundo e persiste até os dias de hoje, “nesse mundo, mundo, vasto mundo” (mais Drummond – Poema das sete faces). E, se existe algo na humanidade em que o equilíbrio é extremamente fugaz, ele atende pelo nome de aleitamento materno.

Mulheres são diferentes. Mães são diversas. O leite materno é variável. Os bebês são únicos. As culturas são múltiplas. As histórias são singulares. As ideias conflitantes. E, assim, o equilíbrio... fugidio.

Amamentar é uma experiência. Pelo que já foi exposto, seria melhor dizer que amamentar são experiências. Cada díade mãe-bebê tem a sua.

O leite materno é considerado o padrão-ouro da alimentação infantil, exclusivo nos primeiros seis meses de vida, estendido até dois anos ou mais. E ele, o leite materno, é um alimento vivo. Ele se modifica do começo ao final da mamada, do começo ao final do dia e através do tempo, para oferecer para cada bebê o que é necessário e possível em cada fase da vida.

Assim, mesmo que seja fundamental apresentar e introduzir uma alimentação variada, aos poucos, a partir do sexto mês de vida, o leite materno continua nutrindo e protegendo o bebê “do mame até o desmame”, quando quer que ele ocorra.


LADO A – DESROMANTIZAR

Sim, é cansativo.
Sim, é repetitivo.
Já não deveria mais ser necessário abordar essa questão.

Através dos séculos, por questões das mais diversas, a amamentação foi um modelo de cuidados, de amor materno, um sonho, uma meta, uma condição inerente ao ser humano, sem qualquer tipo de questionamento ou queixas.

Por muito tempo não se conhecia ou não se ouvia falar sobre desafios da amamentação, fissuras, mastites, depressão pós-parto, sobre a possibilidade de não amamentar. Casamento, gestação, aleitamento materno, quando traziam “problemas”, eram encarados como um “padecer no paraíso”. E quando o aleitamento materno não era atingido... culpa, culpa, culpa, mais culpa. Ah... e culpa.

Esse universo ainda é romantizado, algumas vezes até glamourizado e exaltado. AMARmentação, leite materno é o AMOR líquido, é o AMOR que transborda pelo peito.

Fortes razões, fazem fortes ações” (William Shakespeare).


OUTRO LADO A – NORMALIZAR

Tão relevante quanto “desromantizar”.

A partir do momento em que os grupos de mães se conectam com facilidade e velocidade através da internet e das redes sociais, as informações e as experiências pessoais assumem um significado importante.

Qualquer pessoa que tenha condições de ser referência (profissionais de saúde materno-infantil, parentes, amigas, líderes religiosos, pessoas “mais experientes”, mulheres que já tiveram essas experiências), além do conhecimento CIENTÍFICO sobre o tema, é RESPONSÁVEL pelos resultados da sua informação.

Quando uma experiência pessoal transita através de redes sociais para milhares ou milhões de seguidores, não há como controlar quem vai receber essa informação e quais podem ser os seus efeitos.

1- Amamentar é um direito da mãe e do bebê. O leite materno é o alimento mais adequado para o lactente do ponto de vista nutricional e imunológico.
2- Amamentar dói, peito sangra, bebê chora demais, quer mamar o tempo todo, ninguém dorme a noite toda. Mas, amamentar vale a pena.

Qual a imagem e a mensagem que vão impactar ao final dessa leitura?
O que vai ficar como “normal”?

Que fique claro:
EXPERIÊNCIA PESSOAL NÃO É EVIDÊNCIA CIENTÍFICA.

Os relatos são depoimentos de situações particulares, verdadeiras e que podem nos alertar para o caminho. Mas, com orientação e acompanhamento adequados, cada mulher faz a sua história, o seu processo de amamentação único.

Desejo da mãe, informação, rede de apoio, políticas públicas, leis, profissionais de saúde materno-infantil éticos, sem conflitos de interesse, controle do marketing de substitutos de leite materno e do seio materno (chupetas e mamadeiras) são parte da trajetória.

AMAMENTAR É UM ATO COMPLEXO E POLÍTICO.

Desromantizar. Normalizar. Qual a medida? Existe alguma certeza?

Viver é isso: Um estado de equilíbrio constante entre tomar decisões e sofrer as consequências que ela implica”.
Jean-Paul Sartre - filósofo, dramaturgo e escritor francês.

Dr. Moises Chencinski - CRM-SP 36.349 - PEDIATRIA - RQE Nº 37546 / HOMEOPATIA - RQE Nº 37545