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As leis existem, mas quem as aplica?

Do site da Crescer

"Até quando vamos levantar os mesmos questionamentos, sem uma solução de verdade?", ressalta o pediatra Moises Chencinski sobre as desigualdades, leis e inconformidades

por Dr. Moises Chencinski - colunista

08/05/2023

Calma. Não fui eu.
Essa frase é de Dante Alighieri, poeta italiano da Idade Média (1265-1321), que escreveu “A Divina Comédia” em 3 partes: Inferno, Purgatório e Paraíso.

O que é uma lei?
De um documento do Senado Federal de 2.004:
No sentido amplo, é toda norma capaz de gerar direitos e obrigações...”.

Mas a Lei, Ora, a Lei. Também não fui eu.
Essa é de Getúlio Vargas, após virar “ex-presidente” quando alertava que apesar das leis trabalhistas de seu governo, os empresários não as cumpriam. 

Ninguém pode alegar desconhecimento da lei para não a cumprir.

Sabia disso? Está no artigo 21 do Código Penal Brasileiro (1.943) e no artigo 3º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (1.946).

A lei maior do nosso país é a Constituição Federal (1.988), que, em seu artigo 59 determina os tipos de leis que são de responsabilidade do Legislativo (leis complementares, ordinárias, delegadas, medidas provisórias, decretos legislativos e resoluções).

Além dessas, os estados e municípios podem ter suas legislações específicas, com temas de interesses locais, e suplementar a lei federal, desde que estejam em ressonância com a Constituição.

Nada está acima da Constituição ou pode diferir ou discordar dela.

Quantas leis existem no Brasil? Fui pesquisar e achei números que variam entre 37.000 e mais de 100.000. É muita lei. É lei para todos os gostos, desde as mais gerais até as mais específicas. E até as mais bizarras.

E não se pode alegar desconhecimento da lei? Será que, sem consultar, os advogados, juízes, até os excelentíssimos Ministros do Supremo Tribunal Federal conhecem todas as leis? E, mais importante. Será que todos se lembram de todas elas e guiam suas ações embasados nelas, o tempo todo, no seu dia a dia?

O Brasil teve e tem leis das mais ... questionáveis (para não correr risco de processos... rsrs). E isso não acontece só aqui.

- Leis que instituem dias oficiais, ainda em vigor:
14/09 – Dia de Reconhecimento Oficial dos Ouvidores de Vozes em Ribeirão Preto;
20/06 – Dia Estadual do Fusca – Estado de São Paulo.

- Leis que existiram (acreditem) mas que não existem mais (folclóricas):
1984 a 1991: Em Rio Claro (SP) era proibido comer melancia por riscos de contrair doenças como tifo e febre amarela (7 anos de mito).
2004 a 2007: Em Aparecida do Norte (SP), leis propostas (pelo mesmo político) que proibiam minissaia no período da Quaresma e lei que proibia enchentes.

- O mundo “civilizado e evoluído” também provoca o bom senso comum:
Inglaterra - Proibido beijar na boca em estações de trem (2.009) para não haver riscos de atraso nos trens (pontualidade britânica?).
Espanha – Em 1.999, era proibido morrer na cidade de Lanjaron, porque o cemitério estava lotado, até a prefeitura encontrar um novo terreno e construir outro cemitério.

E muito mais leis como essas estão espalhadas pelo mundo. Dá um Google.

Hoje de manhã, uma postagem no Instagram do queridíssimo Alexandre Coimbra, em que ele abordava a “nova lei” sobre igualdade salarial de gêneros, dentro de uma reflexão muito mais ampla sobre respeito e equidade, chamou minha atenção. Vem comigo aqui em 3 leis, entre muitas, com duas perguntas em mente:

- Precisa de lei para isso?
- A lei cumpriu seus objetivos?

1) Violência contra crianças e adolescentes
1.990
– Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) – já trazia que:
- Artigo 5: “Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais”.
- Artigo 18: “É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor”.

Em 2.014, foi instituída a Lei da Palmada (informal) ou Lei do Menino Bernardo (para que não se esqueçam do caso) e os mesmos artigos 18 e 70 do ECA foram atualizados.

2) Preconceito Racial
1.988
– Constituição Federal – traz que:
- Artigo 3 – IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
1.989 – A Lei do Crime Racial (lei Nº 7.716 - 05/01/1.989) define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor.

Em 2.023, nova lei, Nº 14.532 (11/01/2023) altera as anteriores e tipifica a injúria racial como crime de racismo.

3) Equidade salarial de gêneros
1.943
– Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) – já apontava que:
- Artigo 461 – Sendo idêntica a função, a todo trabalho de igual valor, prestado ao mesmo empregador, na mesma localidade, corresponderá igual salário, sem distinção de sexo, nacionalidade ou idade.
1.952 – Modificação da redação do artigo 461 da CLT pela Lei 1.723 (08/11/1952), mas mantendo o teor.

E agora, em 2.023, novo PL 1085/2023, aprovado na Câmara dos Deputados, seguindo ao Senado Federal que “dispõe sobre a igualdade salarial e remuneratória entre mulheres e homens para o exercício de mesma função e altera (???) a Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943”.

O mundo mudou muito nesse último século. Com certeza, estamos mais atentos a situações sociais, culturais, econômicas e isso levanta muitos questionamentos. Mas até quando vamos levantar os mesmos questionamentos, sem uma solução de verdade?

E concluindo com as mesmas perguntas:
- Precisa de lei para isso?
Para proibir violência contra crianças e preconceito racial e de gêneros?

- A lei cumpriu seus objetivos?
Já são quase ou mais de 50 anos desde a primeira lei, que ninguém pode alegar desconhecimento e, ainda assim elas precisam ser alteradas de tempos em tempos?

Você quer me ajudar a entender e responder?

Dr. Moises Chencinski - CRM-SP 36.349 - PEDIATRIA - RQE Nº 37546 / HOMEOPATIA - RQE Nº 37545