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Sobre arte, vida, medicina, médicos, saúde, inspirações e o caminho.

Do site da Crescer

"Apesar de todo o esforço, de toda dedicação, de todo empenho de muitos de nós, seguimos com poucas certezas, mas com muitos 'dar-se um jeito'", diz Moises Chencinski

por Dr. Moises Chencinski - colunista

17/04/2023

A arte nos traz formas de enxergar, ouvir, sentir ou entender uma mensagem de jeitos diferentes, e nos inspirar para a vida. Ainda não resolvi se, para mim, a arte imita a vida ou se a vida imita a arte (já escrevi sobre isso aqui). Mas, se essa reflexão for suficiente para me fazer chegar mais perto dos meus sonhos ou das minhas realizações, de verdade, arte ou vida, o que veio primeiro, não faz muita diferença.  

Se a vida te der limões, faça uma limonada.

Isso é ou não é uma forma diferente de encarar o “Ih, não deu certo”?
Essa frase é de autor desconhecido. Ou, de um jeito menos “popular” e até mais poético:

Se as coisas não saírem como o esperado, faça o inesperado trabalhar a seu favor.

Esse pensamento é de José Andrés, um grand-chef espanhol, convidado para um discurso de formatura da George Washington University (GWU), explicando algumas das lições de vida que aprendeu na sua trajetória pela culinária.

Essa frase, em especial, de seu discurso me chamou a atenção:
Às vezes, nossas jornadas podem parecer incertas e sem propósito, mas cada passo que damos nos aproxima de entender por que estamos aqui.

E, por isso, continuamos nossa jornada.

O mais importante e bonito, do mundo, é isto: que as pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas, mas que elas vão sempre mudando.

E essa frase? De quem e de onde?

Quem?
João Guimarães Rosa
(1908-1967) - poeta, novelista, romancista, contista, médico (UFMG – 1930) e diplomata, considerado por muitos o principal escritor brasileiro do século XX e um dos maiores de todos os tempos.

Onde?
A sua obra mais conhecida, mais premiada, traduzida para diversas línguas - “Grande Sertão: Veredas”, publicada em 1956. Guimarães Rosa foi reconhecido por “reinventar” a língua portuguesa, criar palavras e recuperar a linguagem poética.

Vou “dicionarar” (Olha eu inventando palavras.... menos, muito menos) – querendo dizer “ir ao dicionário”.

Vereda (além do óbvio - Parte da caatinga com grande quantidade de água e rica em vegetação).
Caminho estreito. Caminho alternativo e mais certo para se chegar a algum lugar.  Rumo que se dá a uma vida. FIG. Momento oportuno para algo.

Vou aproveitar essa “vereda” e direcionar esse texto.


Medicina. Médicos. Saúde. Aleitamento Materno.

Só para não ficar muito amplo e para ter foco (só por conta disso – acredita?), quero centralizar esse raciocínio para o aleitamento materno. E a informação que eu transmitir aqui a respeito da Medicina pode ser ampliada para as outras áreas da saúde materno-infantil (enfermagem, fonoaudiologia, nutrição, psicologia, odontologia, fisioterapia, serviço social e... perdão se deixei de citar mais alguma área).

- Em 10.000 horas de ensino no curso de formação médica (6 anos), temos 15 horas dedicadas à nutrição. Adivinhe quanto se fala de leite materno nessas horas...

- Em 3 anos de residência médica da área de Pediatria, a imensa maioria dos futuros pediatras não pisa em um banco de leite humano (BLH) e não conhece nada a respeito de suas ações, de seu funcionamento e dos cuidados com o leite materno. E temos a maior rede de BLH do mundo, com tecnologia exportada para mais de 30 países.

- Em 3 anos de residência médica da área de Pediatria, o tempo dedicado ao ensino sobre o Leite Humano e a amamentação não chega a, no máximo, 30 dias.

A última pesquisa sobre as taxas de aleitamento materno no Brasil (ENANI-2019) traz dados que podem ser comparados com os de 2.006 (13 anos):
- Aleitamento materno exclusivo em crianças menores de 6 meses – aumento de 8%.
- A duração mediana de aleitamento materno exclusivo passou de 54 para 90 dias.
- A duração mediana de aleitamento materno passou de 11,2 para 15,9 meses.
E isso em 13 anos.

Aos 6 meses de idade, pelos dados do mesmo ENANI-2019, apenas 2% dos lactentes estavam em aleitamento materno exclusivo. Só para esclarecer: Duas em cada 100 crianças estava em aleitamento materno exclusivo aos 6 meses de idade.

A vida é feita de poucas certezas e muitos dar-se um jeito.
Guimarães Rosa de novo. Retrato da nossa realidade, do nosso dia a dia. Apesar de todo o esforço, de toda dedicação, de todo empenho de muitos de nós, seguimos com poucas certezas, mas com muitos “dar-se um jeito”.

As taxas de vacinação infantil estão caindo. Dá-se um jeito.
As taxas de obesidade infantil no Brasil estão aumentando. Dá-se um jeito.
As taxas de violência e abuso na infância estão aumentando. Dá-se um jeito.

Mas o jeito, o “jeitinho brasileiro”, não está resolvendo. Onde estamos errando? (Nossa, escrevi isso em 2.011...)

E mesmo assim, seguimos. Mesmo com os desafios, com os tropeços, com todas as dificuldades. Seguimos. Vou recorrer, mais essa última vez, a João Guimarães Rosa:

“A vida... o que ela quer da gente é coragem”.

E coragem é o que nós mais temos. Coragem não nos falta. E, por isso... vida que segue. E no final, o caminho vai ter valido a pena. E, mais relevante do que isso, será ter compartilhado essa trilha com vocês. E cada um de vocês sabe o quanto isso é fundamental. E cada um de vocês sabe de quem eu estou falando...

– Quem estará nas trincheiras ao teu lado?
– E isso importa?
– Mais do que a própria guerra.

O pensamento é atribuído a Hemingway, sem fontes que confirmem essa autoria.

Dr. Moises Chencinski - CRM-SP 36.349 - PEDIATRIA - RQE Nº 37546 / HOMEOPATIA - RQE Nº 37545