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Se não mudar o que faço hoje, todos os amanhãs serão iguais a ontem

Do site da Crescer

O pediatra Moises Chencinski aborda as necessidades que as crianças têm para um desenvolvimento pleno na infância e a importância de um envolvimento de toda a sociedade para que isso, de fato, aconteça

por Dr. Moises Chencinski - colunista

31/03/2023

Dia 21 de março foi celebrado o Dia Mundial da Infância, criado pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), para promover uma reflexão sobre as condições de vida das crianças e defender o acesso a direitos básicos de alimentação, moradia, formação social, educacional e de valores.

Segundo dados do mesmo Unicef, “no Brasil, ao menos 32 milhões de meninas e meninos (63% do total) vivem na pobreza, em suas múltiplas dimensões: renda, educação, trabalho infantil, moradia, água, saneamento e informação.”

A frase que dá título a essa publicação é de Millôr Fernandes (M.F. - Rio de Janeiro, 16 de agosto de 1923 — Rio de Janeiro, 27 de março de 2012), desenhista, humorista, dramaturgo, escritor, poeta, tradutor e jornalista brasileiro. E, na minha opinião, um dos pensadores críticos do mundo moderno, com foco especial no Brasil.

E esse texto vai “pegar uma carona” nas suas reflexões.


Ser criança...

“Criança é esse ser infeliz que os pais põem para dormir quando ainda está cheio de animação e arrancam da cama quando ainda está estremunhado de sono.” (M.F.)

Pensando bem, quantas “crianças grandinhas” existem entre nós, hein?

Mas ser criança passa por isso e vai muito além.

Sabe o ECA? O Estatuto da Criança e do Adolescente? Aquele que é lei desde 1990, e que “dispõe sobre a proteção integral à criança e ao adolescente”?

Aquele que no seu Art. 7º aponta que “a criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência”.

Já citei aqui, inclusive, a referência ao aleitamento materno nessa lei, no que diz respeito às orientações no pré-natal, à responsabilidade dos hospitais, públicos  e particulares, de orientar, antes da alta, sobre técnicas adequadas de amamentação e às condições nas instituições e locais de trabalho, para uma mãe que queira manter o aleitamento.


“Dito e feito; tudo foi dito e nada foi feito”
(M.F.)

O projeto de lei de amamentação em público, onde quer que seja, sem constrangimento e com punição para quem o fizer, proposta em agosto de 2.015 (há 7 anos e meio), acredite se quiser, ainda não foi aprovada, passando por 22 ações registradas, algumas secretarias, comissões, relatoras designadas por essas secretarias, análises e emendas. Sabe o que falta para essa lei ser aprovada? Uma assinatura. Juro. E ela não aconteceu ainda porque a relatora designada em 18/08/2021 teve seu mandato encerrado em 31/01/2023 e está aguardando por nova indicação (que até agora, enquanto escrevo aqui, ainda não foi designada).


“Viver é desenhar sem borracha” (M.F.)

 A criança é um ser em desenvolvimento constante. Seus órgãos, suas funções, são determinadas desde a gestação, passando pelo parto, dia após dia. Pré-natal adequado, parto possível, aleitamento materno, alimentação saudável, vacinação em dia, cuidados higiênicos, contato e interação com a natureza, acompanhamento profissional, educação, segurança são alguns dos passos fundamentais que merecem, todos esses e mais, atenção constante.

Qualquer dessas etapa que não seja respeitada, que não tenha o cuidado devido, pode influenciar e levar a problemas de saúde física (crescimento, anemia), intelectual (os dois primeiros anos de vida representam o de maior velocidade de crescimento cerebral), emocional, afetivo, infeccioso (quando o sistema imunológico ainda está em formação), trazendo riscos potenciais para um desenvolvimento pleno.

 
“Brasil, condenado à esperança”. (M.F.)

Mas, de uma forma ou de outra, elas crescem. Na saúde, na doença, na alegria, na tristeza, na riqueza e na pobreza...

A esperança é a última que morre. Mas, ela está “doente”. E a doença é crônica e está evoluindo.

As taxas de insegurança alimentar vêm aumentando, as de aleitamento materno estacionando e as de cobertura vacinal infantil diminuindo.

E isso não é de hoje. Temos uma longa trajetória de altos e baixos. Eu bem que queria dizer, sem ficar vermelho, que temos mais altos do que baixos. Hoje quero ser muito, muito, muito otimista. Um empate, quem sabe? No máximo.

Mas, para alcançar um futuro promissor, temos que nos desprender do passado e trabalhar muito seriamente no presente. Não dá mais esperar.

Será que podemos, queremos, iremos mudar essa história ou continuaremos só seguindo, o que parece ser a realidade?

O que o tempo nos mostrou é que, mesmo com todas as possibilidades de evolução,

E, muitas vezes com os caminhos que pareciam certos para o momento, os resultados desejados, e até algumas vezes planejados, não surtiram efeito, não foram sustentáveis.


“O Brasil tem um enorme passado pela frente”
. (M.F)

E superar esse passado parece, a cada dia, mais difícil.

E a criança? Ela cresce. Ela se desenvolve. Ela perde a beleza da inocência, da irresponsabilidade, da vida. E, aos poucos, perde a infância.

E nós, os adultos responsáveis, que deveríamos cuidar do futuro do país, da sociedade, da família, da criança, continuamos a tentar, em vão, procurar caminhos lógicos, sem imaginação, sem sonhos, como gente grande em quem nos transformamos.

Talvez a resposta esteja, mais essa vez, com Millôr Fernandes.

“Pegamos o telefone que o menino fez com duas caixas de papelão e pedimos uma ligação com a infância.” (M.F.)

 

Dr. Moises Chencinski - CRM-SP 36.349 - PEDIATRIA - RQE Nº 37546 / HOMEOPATIA - RQE Nº 37545