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Quem “ensina” quem “ensina” uma mãe a amamentar?

Do site da Crescer

Exatamente o que você leu: quem são as pessoas responsáveis pela produção da informação que chega até as mães e seus filhos na hora que precisam? Moises Chencinski aborda o assunto e nos deixa um olhar atento e necessário sobre o tema

por Dr. Moises Chencinski - colunista

20/03/2023

Não, você não leu errado e não foi erro de digitação. A repetição é proposital. E o significado é esse mesmo. Quem é que “educa” quem vai orientar uma mãe que quer amamentar? 

- Consulta com o pediatra no pré-natal a partir da 32ª semana de gestação.
- O leite materno – padrão-ouro da alimentação infantil. Composição.
- E os prematuros? Podem receber leite materno? Mamam direto ao seio?
- Amamentação na 1ª hora de vida.
- Oferecer um ou dois seios? Livre-demanda?
- Posição e pega mais adequadas?
- Tem ou não freio de língua? Ele atrapalha a mamada?
- Bico de silicone? Chupeta? Mamadeira?
- Fissuras (feridas) nas mamas. Mastites. Ducto obstruído.
- Aleitamento materno exclusivo até o 6º mês.
- Choro, cólicas, gases, refluxo, alergias, arrotos (tudo na amamentação).
- Rede de apoio?
- Profissionais relacionados ao aleitamento materno e suas participações (obstetras, doulas, consultoras, fonoaudiólogas, enfermeiras, nutricionistas, psicólogas, assistentes sociais, osteopatas, odontopediatras, cirurgiões pediátricos, pediatras).
- Rede de banco de leite humano (Rede BLH). Doação de leite.
- Lactogestação. Amamentação em Tandem. Amamentação gemelar.
- Licença-maternidade. Licença-paternidade. Volta ao trabalho.
- Amamentação em público.

Eu poderia continuar por mais umas 10 páginas e não esgotaria o tema, nem os desafios e nem as orientações a respeito de aleitamento materno.

E se eu te dissesse que praticamente nada disso (e nada do que não está escrito aqui também) é ensinado durante os seis anos básicos de praticamente nenhuma faculdade de medicina?

E se eu complementasse e dissesse que durante os 3 anos de residência médica pediátrica nem 20% desses temas são abordados de forma satisfatória?

E se eu te dissesse que isso acontece também nos cursos de nutrição, enfermagem, fonoaudiologia, fisioterapia, psicologia, e de praticamente todos os profissionais que trabalham com a saúde materno-infantil?

E se, no meio de todo esse “furdúncio”, aparecem ainda um bebê, uma mãe, uma família, que recebem milhões de “informações” através do Google, e das redes sociais, e dos grupos de WhatsApp, e dos grupos de mães, todos sem filtro, e até de profissionais de saúde materno-infantil (ou não) que, na sua maioria, não está adequadamente preparada para acolher, escutar, diagnosticar e orientar a díade (mãe-bebê)?

Um caos! Assim como a vida da mãe que quer amamentar, sem orientação e sem apoio.

E alguém ainda tem a coragem de pensar e dizer que amamentar é fácil, simples e natural?

Mas, pelo menos durante os últimos 50 anos, muitos profissionais têm se preparado, estudado, pesquisado, se dedicado a esse tema, que tem muito mais importância do que as instituições atribuem a ele. Lamentavelmente, os cursos, congressos, simpósios, jornadas de pediatria não dão o devido valor e espaço ao tema “amamentação”.

Não consigo imaginar uma atividade para estudos e atualizações na área de pediatria em que não se fale sobre aleitamento materno, independente da especialidade. O tema da Semana Mundial de Aleitamento Materno de 2.018 foi: Amamentação é a base da vida. Se ela é a base da vida, ela é a base da saúde infantil. E, se a Pediatria é a especialidade que estuda as crianças, não deveria haver nenhum encontro de ensino em que o aleitamento materno não tivesse pelo menos uma palestra ou uma mesa ou... Mas, infelizmente...

E se eu te dissesse ainda que grande parte dos cursos em que o aleitamento materno é incluído é “apoiada” e “patrocinada” pela indústria de substitutos de leite materno, mesmo que exista dentro de uma legislação (NBCAL) uma clara manifestação contrária a essa prática, sobre conflitos de interesses? Lei. Ética. Moral. Conceitos tão necessários e tão pouco lembrados ou valorizados nos dias de hoje

E dizem que amamentar é instintivo, que é intuitivo. Dizem que nasce um bebê, nasce uma mãe. De onde tiraram essa bobagem?

E no final, a culpa é da mãe (contém triste ironia). A culpa é sempre atribuída à mãe. A única coisa que ela tem a fazer (continua contendo ironia) depois que nasce um filho é cuidar dele. Amamentar, trocar as fraldas, colocá-lo para dormir, dar banho e se sentir agradecida por Deus ter propiciado toda essa bênção a ela.

Aleitamento materno é uma ação multifatorial que pode requerer a ação de uma equipe multiprofissional. Assim, dentro da área médica, deveria ser uma especialidade pediátrica ou, no mínimo, uma área de atuação específica. E o mesmo deveria valer para todas os cursos de formação de todos os profissionais que atuam nessa área. As atualizações são constantes. No PubMed, um banco de referência de publicações médicas, só em 2.023, até agora, há 1.049 novos estudos sobre aleitamento materno.

E como transferir esses dados ou como filtrar toda a carga de informações que uma mãe recebe, quando está sozinha, solitária, com desafios importantes, sem apoio, buscando na internet e encontra, em menos de 2 segundos:

- Aleitamento materno - Aproximadamente 8.690.000 resultados.
- Amamentação - Aproximadamente 52.200.000 resultados.
- Breastfeeding (em inglês) - Aproximadamente 566.000.000 resultados.

Aleitamento materno é um tema complexo que requer conhecer a prática, a teoria, relacionar uma com a outra, analisar e voltar para a prática para elaborar uma nova teoria para se praticar, até encontrar o equilíbrio. E não há equilíbrio possível na estagnação.

Viver é como andar de bicicleta. É preciso estar em constante movimento para manter o equilíbrio.”
Albert Einstein

Dr. Moises Chencinski - CRM-SP 36.349 - PEDIATRIA - RQE Nº 37546 / HOMEOPATIA - RQE Nº 37545