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Amamentação cruzada parece solidariedade, mas não é...

Do site da Crescer

O aleitamento materno cruzado consiste na prática de uma mãe amamentar outra criança que não a sua ou de deixar seu filho ser amamentado por outra mulher. Isso é bom? Infelizmente, não

por Dr. Moises Chencinski - colunista

12/11/2021

Aleitamento materno desde a sala de parto até 2 anos ou mais, exclusivo e em livre-demanda até o sexto mês. Essa é a recomendação da OMS, do Ministério da Saúde, da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), entre outras organizações. As ações positivas dessa proposta são incontestáveis e, a cada dia, mais e mais pesquisas demonstram o quanto a ciência comprova a importância dessa indicação.

Mas, como estamos por aqui? Será que nossas taxas são significativas? As mães brasileiras são orientadas e seguem essa recomendação?

As últimas pesquisas foram realizadas em 2006 e, desde então, seguimos com políticas de saúde baseadas nesses estudos. Na comparação de 1976, 1986, 1996 e 2006, os dados de aleitamento materno apresentaram evoluções consistentes, mas, desde então, não temos informações precisas sobre os resultados de todas as ações realizadas anteriormente e, especialmente, nesses últimos 13 anos.

ENANI-2019 (Estudo Nacional de Alimentação e Nutrição Infantil) trouxe dados extremamente relevantes sobre o aleitamento materno no Brasil. Algumas reflexões importantes, que vão além das estatísticas mais frias, precisam repercutir em todos os setores da nossa sociedade, inclusive e, especialmente, nas políticas públicas e nos profissionais de saúde materno-infantil.

Aos poucos (por algumas semanas), quero trazer alguns desses dados relevantes para a discussão. E por conta do ineditismo dessa pesquisa, quero começar por um tema polêmico.

Amamentação cruzada

O aleitamento materno cruzado consiste na prática de uma mãe amamentar outra criança que não a sua ou de deixar seu filho ser amamentado por outra mulher. Os resultados do ENANI trazem uma prevalência de 21,1%, ou seja, praticamente uma em cada 5 mães praticava a amamentação cruzada durante o período da pesquisa.

Então isso é bom? Infelizmente, não. A cultura da ama de leite no Brasil vem de muito tempo atrás até o advento da AIDS, quando se comprovou a transmissão vertical (passagem do vírus através do leite materno), contraindicando formalmente a amamentação para recém-nascidos de mães soropositivas. Como essa é uma doença que pode cursar sem sintomas por um determinado período, levando a um atraso perigoso no diagnóstico, e os tratamentos eficazes são ainda muito recentes para mudança de rotina, essa recomendação permanece ainda em vigor.

Por conta dos riscos envolvidos, o Ministério da Saúde estabeleceu, em 1993 e em 1996, duas portarias contraindicando a prática da amamentação cruzada.

Além disso, outros (poucos, mas importantes) fatores podem trazer riscos ao bebê quando amamentado e são levados em conta, inclusive, quando uma mãe deseje doar o seu leite para um banco de leite. Existem orientações rígidas nesse sentido (RDC nº 171), para que não haja nenhum risco na doação.

Os cuidados começam na seleção das mães doadoras, com recomendações de não usarem medicamentos que ao passarem pelo leite possam causar danos à saúde do bebê, não usarem álcool ou drogas ilícitas, entre outras. Além disso, é feita uma análise criteriosa do leite doado, desde os cuidados com sua extração pela mãe, transporte e caraterísticas químicas e microbiológicas. Depois disso, ainda tem a pasteurização, que confere segurança máxima para quem vai consumir esse leite.

Assim, por mais que o leite materno seja o padrão-ouro da alimentação infantil, por mais que possa ser considerado um ato de solidariedade e representar um ato de amor, a amamentação cruzada pode trazer riscos para a saúde e para a vida de um bebê.

Se tiver leite excedente e quiser doar, entre em contato com um banco de leite próximo e você poderá salvar muitas vidas, de forma segura.

Dr. Moises Chencinski - CRM-SP 36.349 - PEDIATRIA - RQE Nº 37546 / HOMEOPATIA - RQE Nº 37545