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Quando pensar em doença celíaca?

Especialista:

Dados do profissional

Esse é um diagnóstico difícil, cada vez mais pensado e, assim, mais diagnosticado.

Esse é um texto atual do site da Sociedade de Pediatria de São Paulo (SPSP), escrito por uma das especialistas que indico em meu site. 

A idéia desse artigo, que, apesar de estar em termos mais científicos, está claro naquilo que interessa a todos, não é assustar ninguém com um monte de nomes de doenças (por favor, não perguntem ao Dr. Google, tá?).

A intenção é mostrar como é importante a avaliação adequada e porque não se deve introduzir o tratamento (que é só dietético), sem a certeza do correto diagnóstico.

Acompanhem a seguir.

Dr. Moises

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Sabemos que a prevalência de doença celíaca no Brasil, mais especificamente no Estado de São Paulo, é alta, à semelhança dos países da Europa. Os dois estudos publicados a respeito da prevalência de doença celíaca em doadores de sangue realizados no Estado de São Paulo, um na cidade de Ribeirão Preto e outro na cidade de São Paulo, demonstraram prevalência de 1 celíaco para cada 273 e 1 celíaco para cada 214 doadores de sangue, respectivamente. 


Assim sendo, onde estão esses indivíduos com doença celíaca? 

Quando devemos pensar nessa doença e, consequentemente, identificar esses pacientes dentre as crianças e adolescentes que atendemos diariamente? 

Deve-se ter ciência que essa doença pode se apresentar com um sinal/sintoma ou um conjunto de sinais/sintomas que não, necessariamente, seja do sistema digestório. Em resumo, a forma de apresentação da doença celíaca pode ser: 

• Clássica (ou típica): quando o paciente apresenta diarréia crônica, que em geral é acompanhada por distensão abdominal e perda de peso. Podem também estar presentes a atrofia da musculatura glútea, falta de apetite, alteração de humor como irritabilidade e/ou apatia, anemia e vômitos. 

• Não clássica (ou atípica): quando o paciente não apresenta manifestações gastrintestinais ou quando estas não são as mais importantes. Possivelmente, a doença celíaca é subdiagnosticada por falta de conhecimento de que essas manifestações, descritas a seguir, que podem se apresentar isoladamente ou em conjunto, são decorrentes da doença celíaca. 
Baixa estatura sem causa definida pode ser a única manifestação clínica da DC; anemia por deficiência de ferro que não responde à ferroterapia oral; anemia por deficiência de folato ou vitamina B12; baixa densidade mineral óssea evidenciada no exame de densitometria óssea sem causa aparente, associada ou não a fratura patológica; atraso puberal, assim como irregularidade do ciclo menstrual; hipoplasia do esmalte dentário; artrite do tipo oligo ou poliartrite assimétrica, espondiloartrite ou ambos padrões; manifestações neurológicas como ataxia, denominada por ataxia pelo glúten, neuropatia periférica, miopatia, síndrome constituída pela tríade epilepsia, calcificação cerebral e doença celíaca; anormalidades associadas ao aparelho reprodutor como aborto espontâneo de repetição, esterilidade, menopausa precoce e retardo de crescimento intrauterino do feto; e manifestações psiquiátricas como depressão, autismo e esquizofrenia, que também podem corresponder ao quadro clínico da doença celíaca. 
Também fazem parte dessa forma de apresentação denominada atípica as seguintes condições: constipação intestinal crônica refratária ao tratamento; úlcera aftosa recorrente, elevação das enzimas hepáticas sem causa aparente, fraqueza, perda de peso sem causa aparente, edema de aparição abrupta após infecção ou cirurgia podem corresponder às manifestações da DC.

• Assintomática ou silenciosa: caracterizada por alterações sorológicas e histológicas da mucosa do intestino delgado, com ausência de sintomas. Essa forma de apresentação foi comprovada fundamentalmente entre grupos de risco para a doença celíaca como o de familiares de primeiro grau de pacientes com doença celíaca, e vem sendo reconhecida com maior freqüência nas últimas duas décadas após o desenvolvimento dos marcadores sorológicos para a doença celíaca. 

Também é necessário mencionar que a doença celíaca deve ser investigada nos pacientes que apresentam as seguintes doenças, que constituem nas doenças associadas à doença celíaca: qualquer tipo de doença auto-imune, como diabetes mellitus insulino dependente, tireoidite auto-imune, alopecia areata, deficiência seletiva de IgA, síndrome de Sjögren, colestase auto-imune, miocardite auto-imune; síndrome de Down; síndrome de Turner; síndrome de Williams. 

Outro grupo de risco para doença celíaca é o de familiares de primeiro grau que sempre devem ser investigados. Lembrar que quando a investigação desses grupos de risco resultar negativa para a doença celíaca não significa que esse resultado vale para toda a vida, uma vez que é possível que a doença celíaca se manifeste em algum outro momento da vida dessas pessoas dos grupos de risco.

É extremamente importante mencionar que a instituição do tratamento da doença celíaca deve ser iniciada somente quando houver a confirmação diagnóstica com emprego dos marcadores sorológicos para a doença celíaca e após a realização da biopsia de intestino delgado. Esta última, até agora, em qualquer local do mundo, é imprescindível para o diagnóstico dessa doença. 

Portanto, não se deve a partir de qualquer quadro clínico sugestivo para essa doença instituir a dita "prova terapêutica", isto é, retirar o glúten da dieta. Deve-se lembrar que o tratamento que se caracteriza pela dieta totalmente sem glúten deve ser realizado durante toda a vida e, portanto, o diagnóstico deve ser preciso. 

O protocolo para doença celíaca será instituído em breve pelo Ministério da Saúde do Brasil com a finalidade de padronizar, especialmente, os critérios diagnósticos dessa doença, e consequentemente a difusão do conhecimento dessa doença, que possivelmente vai contribuir com maior número de diagnóstico correto da doença celíaca.