Pediatria

Limites

Quem nunca viu aquela criança, no Shopping, que se joga no chão, chora, faz o maior escândalo e os pais, sem saber o que fazer, passam a maior vergonha?

- Que criancinha malcriada. Comigo isso nunca aconteceria. Eu sei bem o que eu faria!!

E, algum tempo depois, em uma tarde no Shopping, é o seu filho que protagoniza esta cena.

Quando foi que você mudou de idéia? Em que pedaço deste caminho, você perdeu o controle desta situação?

As gerações foram se alternando entre o militarismo ditatorial (onde nada era permitido e predominava o NÃO), a permissividade de Woodstok (onde tudo era permitido e predominava o SIM) na busca do equilíbrio (onde tudo seria permitido dentro de certos limites e predomina o TALVEZ).

Assim, eu os convido a pensar e a responder a esta pergunta (que eu farei a seguir), apenas após a leitura destes textos e sua análise. Se não concordarem, sinal de que vocês leram os textos e avaliaram, critiquem e me mandem outras sugestões e opiniões. Se concordarem, mãos à obra.

- Eu vou fazer uma pergunta agora e quero que vocês pensem, enquanto eu examino o seu filho, e me respondam, se puderem, só depois disso. Pensem bem antes de responder porque a resposta mais imediata e óbvia é automática e não é refletida. Muitos conceitos, muitas posturas terão que ser repensadas. Se vocês não gostam do resultado que vocês, como pais, estão observando hoje, é necessário mudar sua conduta. Dificilmente, vocês, agindo sempre da mesma forma, obterão respostas diferentes da mesma criança. Agora que vocês leram, analisaram, pensaram, leiam a pergunta e respondam:

- O quanto vocês estão dispostos a investir na mudança, se é que ela é importante e fundamental, para que esta situação possa ser encaminhada de um modo diferente do atual, em um tempo ainda não determinado?

Surileia, mãe monstrinha

Era uma vez uma mãe. Uma mãe como outra qualquer.

Esta mãe tinha duas filhinhas queridas. Uma chamava-se Margarida e tinha seis anos. A outra chamava-se Violeta e tinha quatro anos. E, aliás, esta mãe também tinha nome, chamava-se Suriléia, mas não me lembro mais quantos anos ela tinha vivido.

A mãe, Suriléia saía todo dia de manhã para trabalhar e voltava só no final da tarde. Era uma mãe como tantas outras que existem por aí. A única diferença é que, chegando em casa, a Suriléia se transformava.

Não virava Super Mulher ou Mulher Maravilha. Virava Suriléia-Mãe-Monstrinha, com dois colos, quatro pernas, quatro braços e duas cabeças. Ficava um barato de mãe!

A Margarida e a Violeta achavam super legal ter em casa só para elas, a Suriléia-Mãe-Monstrinha.

Querem saber como Suriléia virou Suriléia-Mãe-Monstrinha ???? Foi assim:

“Todo dia naquela casa, era a mesma história. A Suriléia voltava para casa do trabalho e era sempre derrubada no chão pelos abraços das filhinhas, até que deixava a Suriléia bem contente, apesar de que se machucava um pouquinho. O que Suriléia não gostava era a confusão. Cada uma queria mais atenção que a outra, queria a mãe só para ela e então Suriléia ficava quase louca!

Enquanto a Margarida contava toda animada que tinha feito um teatrinho na escola, a Violeta queria colo e queria contar que, naquela dia, tinha brigado com a amiguinha porque as duas queriam brincar com a mesma boneca. E Suriléia queria ouvir a história das duas, só que as duas contavam tudo ao mesmo tempo. E então, ela queria olhar para as duas, só que quando olhava para Violeta, a Margarida puxava o seu rosto, e vice versa quando olhava para Margarida, a Violeta puxava o seu rosto. Sem conseguir entender nada, a mãe resolvia então que o melhor era ir dar banho nas crianças.

A Margarida ligava o chuveiro e ia tomar banho. A Violeta então, sentada na privada fazendo xixi, começava a chorar porque queria ser a primeira a tomar banho. E, enquanto a Violeta berrava e a Margarida gargalhava porque a Violeta chorava, a Suriléia puxava os cabelos, pensando no que poderia fazer para acabar com aquela barulheira.

E então, depois de toda aquela confusão, com as meninas prontas para o jantar, começava a confusão na cozinha. Porque, depois da confusão da sala, vinha a do banheiro. E, depois da confusão do banheiro, vinha a da cozinha, né?

Quando acabava o jantar, vinha a disputa por causa da historinha. Todo dia, a mãe Suriléia contava uma historinha. Só que Violeta, que era menorzinha, sempre queria a história do Lobo Mau, enquanto que a Margarida ficava cheia de tanta história de Lobo Mau e queria Caça ao Tesoura, Peter Pan, etc.

E, toda noite, Suriléia saía do quarto com os braços duros e doloridos, pois tinha de sentar-se no meio das camas e dar a mão para as duas.

E foi numa noite dessas quando foi dormir com os braços duros e doloridos, que ela sonhou que virava Suriléia-Mãe-Monstrinha com dois colos, quatro pernas e duas cabeças. E achou tão legal aquele sonho, que quando acordou, tinha virado Suriléia-Mãe-Monstrinha mesmo!!!! Achou incrível e foi acordar as filhas que, depois do susto, acharam a mãe super legal daquele jeito e davam pulos de alegria, cada uma num dos colos da Suriléia-Mãe-Monstrinha.

Quando Suriléia ia trabalhar, virava Suriléia normal, como as outras mulheres. A Suriléia-Mãe-Monstrinha só existia dentro de casa.

Só sei que, então, tudo ficou uma maravilha naquela casa. Menos para Suriléia, né?”

ZATS, Lia. Suriléia-Mãe-Monstrinha. São Paulo, Paulinas. Série Pega-Pega

Sacrifícios de mãe

A pobre mãezinha levou o filhinho ao psicanalista porque ele era incapaz de comer qualquer coisa. Ou coisa alguma. Só gostava de comer o impossível. O médico examinou o crescimento mental do menino e recomendou à mãe (dele) que não forçasse o menino a comer o que ele não gostasse. Percebia-se nitidamente que era um jovenzinho de formação extravagante a quem se deveria oferecer apenas pratos ímpares. Assim foi que a mãezinha, muito da psicanalítica, chegou em casa e perguntou ao filhinho o que é que ele gostaria de comer. O menino nem titubeou. Disse logo:

- “Uma lagartixa”.

Com grande repugnância e não menor dificuldade, a mãe(zinha) conseguiu caçar uma lagartixa e deu-a ao menino. O menino olhou a lagartixa com igual ânsia, um olho pra cá, outro pra lá, os dois olhos parando lá em cima e exclamou:

- “Come vuoí, mamma, que io mangi questa porcheria cosí croda senza ne meno il dopplo burro?” ou seja: “Como é que a senhora pretende que eu coma essa porcaria assim crua: não tem sequer manteiga dupla?”

A mãe, sempre mãe, e mais mãe porque psicanaliticamente orientada, pegou a lagartixa, pô-la na frigideira e fritou-a como o menino desejava.

- Está bem agora ? – perguntou ao menino.

- Não – respondeu a peste – parte ao meio.

A mãezinha tão kleiniana, coitada ! ,fez o que o menino mandava. O menino olhou a mãezinha, a mãezinha olhou o menino, o menino mexeu um olho, a mãe baixou a cabeça meio centímetro, o menino mexeu com o outro olho, a mãe voltou com a cabeça à posição anterior e aí o menino impôs:

- Eu só como a lagartixa se a senhora comer metade.

- Então come que depois eu como – disse a mãe.

- Não, você tem que comer primeiro – disse o menino.

A mãezinha sentiu uma golfada de nojo, mas, que ia fazer ? Mãe é mãe ! Fechou os olhos e, para não sentir, com um gesto rápido jogou metade da lagartixa dentro da goela, engoliu. O menino olhou-a firme, olhou a metade da lagartixa na frigideira e começou a chorar:

- “Ah, ah, ah ! . . . A senhora comeu exatamente a metade que eu gosto. Essa daí eu não como de jeito nenhum.”

PS.: Dizem alguns historiadores que a mãe deu uma bruta surra no garoto. Mas os historiadores que abraçam esta versão não sabem os terríveis traumas (freudianos) que causam na infância esses choques físico-morais provocados por espancamentos.

TODAS AS MÃES MODERNAS PREFEREM COMER LAGARTIXAS.T

Millor Fernandes – Fábulas Fabulosas

Respeito é bom

Dez direitos que os pais têm esquecido de exercer na educação dos filhos, segundo a educadora Tania Zagury.

1) Eles não devem se omitir em dar broncas – sem medo de causar traumas e frustrações – quando o filho agir de forma que possa prejudicar as outras pessoas, os animais e o meio ambiente.

2) Quando o diálogo não funcionar dentro de casa, não tem choro nem vela: cabe aos pais a palavra final sobre qualquer tema.

3) Os pais podem, sim, proibir a filha de usar aquela saia justíssima e o salto alto, em nome da segurança e da dignidade da moça. Podem, também, cortar as asas do filho que quer fazer tatuagens e piercings, ao perceber que ele faz isso com o uso indevido da mesada ou só para imitar os amigos.

4) Drogas: os pais têm o direito de questionar o filho, vigiá-lo e até mesmo invadir sua intimidade se desconfiarem de envolvimento com elas.

5) Os pais não devem se intimidar com a prática de muitos jovens de transformar seu quarto em fortaleza indevassável. Sempre que tiverem um bom motivo – e mesmo que não sejam bem-vindos – eles estão liberados para entrar.

6) Liberdade para fazer o que se quer da vida tem limite: os pais devem exigir que os filhos estudem e podem aplicar castigos como o corte de mesada e da internet se perceberem que eles não estão cumprindo seus deveres.

7) Os pais podem – e devem – frear o apetite consumista dos filhos. Uma coisa é comprar um tênis ou uma jaqueta por necessidade; outra bem diferente é fazer exigências só por capricho.

8) Ter conversas sérias sobre sexo é uma necessidade. Se o adolescente se negar, acusando os pais de “caretas”, eles podem exigir que o jovem se sente e ouça o que têm a dizer. Os pais também não têm a obrigação de aceitar, só porque é moderno, que os filhos mantenham relações sexuais em casa.

9) Eles não são obrigados a proporcionar luxos como viagens ao exterior quando o filho passa de ano ou carro zero como prêmio por entrar na Faculdade. Ao ir bem na escola, o adolescente está apenas cumprindo sua obrigação.

10) Os pais têm direito a um mínimo de vida pessoal. Pelo menos de vez em quando, não devem se privar de uma jantar romântico ou uma viagem sem a presença dos filhos. E também não devem se sujeitar à tirania da agenda dos adolescentes no fim de semana.

 


Trecho retirado do livro Os Direitos dos Pais da Educadora e Professora Tania Zagury – Editora Record – RJ.
No site www.taniazagury.com.br você pode conhecer a obra completa desta autora.

Leitura recomendada para os pais

Na minha opinião, estes são alguns dos livros que todos os pais deveriam ler antes e depois de terem filhos.
Conheça um pouco sobre as obras e seus autores.

LIMITES SEM TRAUMA 
Autora: Tânia Zagury
Editora: Record – RJ / Ano: 2.000
Edição: 72ª / Número de páginas: 176

Este é o livro que eu recomendo, quando quero alertar e orientar os pais sobre a questão dos limites na criança. Gosto muito do jeito objetivo, realista e educativo que a autora coloca em seus textos.

Como, quando e por que dizer “não” aos filhos e também como, quando e por que dizer “sim” são atitudes que merecem uma reflexão maior.

Limites sem Trauma ficou durante 56 semanas nas listas dos mais vendidos (anos de 2001 e 2002) do Brasil, permanecendo por mais de 2 meses em primeiro lugar na categoria não-ficção, fato até então, inédito no Brasil. Em 2001 foi o 7º livro mais vendido no Brasil, segundo a Revista Veja. Atualmente o livro já está traduzido para o italiano, francês e espanhol e encontra-se na 72ª edição, com mais de 200.000 exemplares vendidos no Brasil.

Os capítulos são divididos por faixas etárias, indicando o que cada criança precisa na fase de desenvolvimento pela qual ela está passando, mas sempre relacionando com as tarefas dos pais em relação aos limites.

A seguir, um trecho do livro para começar a pensar e sair correndo para comprar, ler e aplicar.

Dar limites é…
-Ensinar que os direitos são iguais para todos.
-Ensinar que existem OUTRAS pessoas no mundo.
-Fazer a criança compreender que seus direitos acabam onde começam os direitos dos outros.
- Dizer “sim” sempre que possível e “não” sempre que necessário.
-Só dizer “não” aos filhos quando houver uma razão concreta.
-Mostrar que muitas coisas podem ser feitas e outras não podem ser feitas. -Ensinar a tolerar pequenas frustrações no presente para que, no futuro, os problemas da vida possam ser superados com equilíbrio e maturidade (a criança que hoje aprendeu a esperar sua vez de ser servida à mesa amanhã não considerará um insulto pessoal esperar a vez na fila do cinema ou aguardar três ou quatro dias até que o chefe dê um parecer sobre sua promoção).
-Evitar que seu filho cresça achando que todos no mundo têm de satisfazer seus mínimos desejos e, se tal não ocorrer (o que é mais provável), não conseguir lidar bem com a menor contrariedade, tornando-se, aí sim, frustrado, amargo ou, pior, desequilibrado emocionalmente.
-Dar exemplo! Quem quer ter filhos que respeitem a lei e os homens tem de viver seu dia-a-dia dentro desses mesmos princípios, ainda que a sociedade tenha poucos indivíduos que agem dessa forma.

Para conhecer um pouco mais sobre a autora e sua obra, entre em seu site:
www.taniazagury.com.br

 


UM MENINO DE OLHO NO MUNDO
Autor: Marc Simont
Editora: José Olympio / Ano: 1994
Edição: 4 / Número de páginas: 85

Livro agradável, de leitura fácil, muito bem ilustrado. Cada página contem uma dica ou uma orientação e uma ilustração grande, simulando esta situação.

Vale, principalmente, pelo alerta de nos colocarmos, de vez em quando, no lugar de nossas crianças e tentarmos imaginar a razão para suas atitudes.

Os diversos aprendizados, os primeiros passeios, o contato com as outras crianças, a chegada de um irmãozinho são explicados de uma maneira leve e bem humorada

Professores que trabalham com a faixa etária de zero a seis anos também deveriam ler este livro.

Além disso, o autor mostra como podemos ser incoerentes ao educar nossos filhos, como quando exigimos que as crianças dividam seus brinquedos com os colegas enquanto, nós somos egoístas em relação aos nossos pertences.

A seguir um trecho do livro (sem a ilustração) para que se entenda do que estamos falando.

Trecho:
“Os adultos eram imensos. Às vezes me assustavam com suas vozes trovejantes. Em certos momentos até meus pais pareciam temíveis. Aonde quer que eu fosse tudo me fazia lembrar a minha pequenez.”

Exigir obediência sem medo de ser autoritário

Recebo um volume grande de correspondência de pais e professores comentando situações do cotidiano que envolvem a educação. Recentemente, li e reli a maioria das mensagens que tenho arquivadas para organizar os assuntos em temas e levantar os mais freqüentes. Mas sabem que notei um fato bem interessante? A palavra obediência quase não é usada por ninguém. Por que será?

Talvez porque nem pais nem professores queiram ser – nem mesmo parecer- autoritários quando educam seus filhos e alunos. Quem teve pais autoritários ou freqüentou escolas assim sabe muito bem que fica mais difícil traçar um rumo na vida com a pressão do autoritarismo. Essa já é uma boa razão para querer educar de um jeito diferente.

Acontece que não ser autoritário não significa, de modo nenhum, não ocupar o lugar de autoridade que ser pai, ser mãe ou ser professor implica. E autoridade supõe obediência. Sem obediência, a autoridade perde o sentido, deixa de ser autoridade. E sem ela a assimetria na relação educativa deixa de existir.

Ocorre que ocupar esse lugar exige comprometimento, dá trabalho e traz responsabilidade. Para falar bem a verdade, é um ônus exercer esse papel porque é preciso estar atento o tempo todo para que ele não se esvazie. Como tem sido cada vez mais difícil sustentar esse lugar, responsabilizar filhos e alunos pela fragilidade do vínculo com a autoridade parece ter sido um caminho quase natural. E a discussão mudou totalmente de foco. Deixamos de falar em obediência e passamos a falar em limites.

Vejam que processo interessante percorremos. Falar em obediência supõe no mínimo dois sujeitos envolvidos: aquele que exerce a autoridade que lhe cabe naquele momento e aquele que precisa responder com um mínimo de obediência para manter o vínculo, a relação. Ao falarmos em limites, podemos supor apenas um sujeito.

Quando uma mãe diz, por exemplo, “meu filho não tem limites”, parece até que ela não está implicada na questão, que ela não tem nada a ver com o fato que descreve. Quando um professor diz que seus alunos não aceitam limites, ele também não se põe na situação, não credita a ele nenhuma responsabilidade pelo fato. E foi assim, sem nos darmos conta, que passamos a colocar todo o fardo do trabalho educativo nas costas de crianças e adolescentes. A história é com eles; eles precisam aceitar os limites e respeitá-los.

Vamos deixar de lado esse constrangimento com a palavra obediência e seu conceito. Mas para isso é preciso, ao mesmo tempo, aceitar que a obediência não precisa ser passiva. Ela pode ser uma obediência participativa, mas, para que assim seja, depende de como os pais e professores exercem a tal autoridade.

Em primeiro lugar, é bom discriminar que são poucas, bem poucas, as situações em que a obediência é uma exigência absoluta. Ao fazerem isso, pais e professores se poupam e preservam seu papel de autoridade. Para que se desgastar querendo que o filho aceite que é preciso vestir determinada roupa ou colocar a roupa suja no cesto, por exemplo? Por que exigir obediência em situações tão banais?

Bem mais simples é a orientação segura e firme nessas ocasiões. Não providenciar a lavagem de roupas que não estejam no local e combinar previamente a situação é bem mais efetivo, assim como deixar que o filho passe frio ou desconforto usando a roupa que escolheu.

Já ir para a escola é uma obrigação, da qual é preciso exigir a obediência, pura e simples.

Os pais percebem isso e dessa questão, em geral, não abrem mão. Sabem, portanto, exercer a autoridade quando é preciso. E sem receio de serem autoritários.

Por último, é bom lembrar que, se há autoridade, há embate; se há regra, há transgressão; se há filhos, haverá desobediências também.

ROSELY SAYÃO é psicóloga, consultora em educação e autora de “Como Educar Meu Filho ?” (Publifolha) – e-mail: roselys@uol.com.br

É preciso ter autoridade

“Se forem omissos por medo de perder o amor dos filhos, os pais correm o risco de ser menosprezados e ignorados“

Ser pai nos dias de hoje não é fácil. O mundo está cheio de opções, e até tarefas aparentemente simples, como escolher um tênis para presentear o filho, são complexas. Trinta anos atrás existiam apenas cinco marcas. Hoje são dezenas. Na hora de comprar o calçado, o pai precisará avaliar se ele será usado para correr, para andar no mato, para sair à noite ou para jogar basquete. Precisa lembrar se o filho pisa com o joelho virado para dentro ou para fora, se a perna de impulsão é a direita ou a esquerda. Esse enorme leque de opções se repete no processo de educação e formação do adolescente. Os pais têm de enfrentar desde a escolha do modelo de escola ideal até o dilema de deixar ou não a namorada dormir no quarto dele. A boa educação, hoje, implica ter posição formada sobre cada um desses assuntos. As variáveis são tantas que os pais precisam ser extremamente cuidadosos para que a postura adotada com relação a um aspecto da vida do jovem não entre em contradição com a adotada em outro. Nesse ponto, a conduta no que se refere aos filhos é como um bambu. Ele pode ser vergado para cá e para lá ao sabor das mudanças – mas não pode ser quebrado a toda hora.

Um aspecto crucial na educação é a autoridade. Muitos pais temem perder o amor dos filhos se forem firmes nas regras e nas cobranças. Todo mundo sabe que adolescente contrariado é encrenca na certa. Como uma criança birrenta, ele reclama, briga e faz escândalo, dentro de uma escala proporcional a seu tamanho. Nesse ponto os pais não podem ceder. Precisam estar conscientes de que, como todo mundo, os jovens não dão afeto a pessoas que não respeitam. Se os pais forem omissos e ficarem quietos por medo de perder o amor do filho, correm o risco de se ver menosprezados e ignorados. Aí o afeto e a cumplicidade que eles queriam preservar acabam se esvaindo completamente. Um pai ou uma mãe que engole os próprios princípios e se cala a cada malcriação dá um atestado de que não se respeita, e os filhos entendem isso como um sinal para que não o respeitem também. Engolir sapo significa deseducar, com grande probabilidade de estar criando um pequeno tirano dentro de casa.

Exercer autoridade de pai e de mãe exige sabedoria. Os limites precisam ser sempre colocados em função de algo e exercidos visando ao bem-estar de toda a família. Necessitam estar a serviço da qualidade de vida e da educação do filho, nunca de um capricho. Muitos pais acreditam que dar o bom exemplo é suficiente, o que não é verdade. Sem uma determinação clara, os filhos não o perceberão e não o seguirão. No outro extremo, abusar de proibições e punições por si só também não funciona.

Os filhos precisam aprender, e cabe aos pais ensinar. Se um filho não quer estudar, não adianta nada os pais se valerem de seu poder, trancá-lo no quarto e obrigá-lo a sair com a matéria decorada. O adolescente não vai estudar e pronto. Por outro lado, os pais podem negociar e dizer que ele vai poder sair, fazer o que quiser, desde que lhes explique o assunto que precisa estudar com suas próprias palavras. Ele terá então estímulo para se debruçar sobre os livros e até se abrirá um canal para que esclareça dúvidas com a ajuda dos pais. Muitas vezes o jovem não estuda simplesmente porque não entende a matéria. Esse é um bom exemplo em que a autoridade estaria sendo usada para a evolução do filho. A maioria dos pais, quando exerce autoridade, simplesmente proíbe o que o filho gosta de fazer. Na verdade, eles deveriam reorientar momentaneamente a energia que o adolescente gastaria numa atividade para outra. Sempre é possível mudar para melhor.

O filho pode ser o folgado que se apóia no sufocado. Nesse caso, a mudança tem de vir do sufocado, pois, se estiver bom para o folgado, ele irá querer ficar nessa posição para todo o sempre, amém! O ser humano é o único que pode mudar sua história, pois tem inteligência e criatividade. Basta acrescentar a motivação.

Içami Tiba – é psiquiatra e autor de quatorze livros, entre eles Quem Ama, Educa! e Anjos Caídos

Disciplina sem culpa

A liberdade sem limites na educação faz estragos. As crianças precisam de regras.

Quantas vezes você e seu marido se sentiram culpados, quase desprezíveis, por terem negado ou proibido alguma coisa aos seus filhos ? Se a resposta for muitas, não se preocupem. Certamente, o único pecado de vocês é saber que, na educação de uma criança, é necessário dizer muitos nãos, mesmo que o coração e a razão digam que é mais simples e gostoso dizer sim.

É preciso coragem para educar as crianças com os limites exigidos pela boa disciplina – que nada tem a ver palmatória nem rigidez dos quartéis. como se não bastasse reprovação filhos contrariados, quem leva educação sério enfrenta também silenciosa censura de um punhado adultos parece repetir, ainda hoje, o refrão É proibido proibir, expressão máxima do desejo liberdade irrestrita, típico anos 60 inclusive na das crianças.

Hoje, passados 30 anos, os adeptos da liberdade sem limites são espécie em extinção. A experiência dessas 3 décadas mostrou que ter abandonado o figurino autoritário da educação tradicional sem substituí-lo por normas flexíveis foi um grande erro. Confunde-se liberdade com falta de limite. E, reforçada pelo uso indiscriminado de conceitos de psicologia, a idéia de que recusas e negativas podiam traumatizar as crianças, abriu caminho para o sentimento de culpa tomar conta dos pais.

Perderam os pais. E, principalmente as crianças que, criadas sob um falso vale-tudo, deixaram de desenvolver sua capacidade de suportar frustrações. Resultado: crianças que não respeitam nada nem ninguém e muitos adolescentes que chegam a agir feito vândalos. Por isso, conceitos de limites e disciplina estão voltando à moda na educação dos baixinhos, desde muito cedo, com critérios, muito carinho – e sem culpa.

Profissionais de diferentes áreas afirmam que o cotidiano infantil está repleto de situações que exigem limites e disciplina desde o berço. Se eles não forem estabelecidos e mantidos, terão reflexos a curto, médio e longo prazo. ”Os limites são tão importantes quanto a liberdade e fundamentais para o exercício da democracia, em que os direitos de todos têm de coexistir. Os limites são importantes na formação da personalidade. Eles servem pra fazer a criança começar a entender que o mundo é de todos, não apenas dela.” (Tania Zagury – educadora).

Bebês habituados a tirar a mãe do banho com um simples choramingo, por exemplo, têm boas chances de usar o choro como instrumento de convencimento junto aos pais no futuro. Assim como quem se acostuma a chupar a chupeta a qualquer momento do dia é forte candidato a carregar o acessório a tiracolo quando for para a escolinha. “Neste último caso, inclusive, a falta de limites é conseqüência da incoerência dos pais. Primeiro a criança é seduzida a aceitar a chupeta, geralmente para dar sossego a quem cuida dela. Se os pais não estabelecem que a chupeta deve ser usada apenas no berço e na hora de dormir, a sedução inicial se transformará em repressão, mais tarde, quando ela for para a escola, por exemplo.” (Lidia Aratangy – terapêuta familiar).

Entre os 7 e 9 meses, os pequenos começam a engatinhar, a mexer em tudo e a entrar em todos os lugares. E já entendem o sentido do não – uma das palavras mais ouvidas nesta fase. Mas o significado da proibição ainda não é totalmente compreendido. Repreendidos quando põem o dedo na tomada elétrica, por exemplo, eles recolhem a mãozinha rapidamente, mas repetem o gesto em seguida. Por segurança e para que aprendam o sentido da proibição, recomenda-se que os locais que ofereçam perigo ou reunam objetos importantes para a família sejam interditados e a proibição deve ser enfatizada verbalmente. A criança precisa saber que há limites e restrições de espaço e de tempo, hora e lugar para brincar e dormir, por exemplo, e que devem ser respeitados.

Ao completar o primeiro aninho, a meninada já entende perfeitamente o significado do não e vive relativamente em paz com os limites, até fazer 2 anos. Então, descobre a birra como instrumento para testar os pais e avaliar sua própria autonomia. Faz de conta que não ouve ou não entende as proibições e inicia uma espécie de queda de braço, que os adultos precisam vencer. Nessa idade, as crianças têm necessidade de endeusar os pais que, com esse ‘poder’, lhes transmitem segurança.” (Ceres Araujo – psicóloga).

É preciso firmeza ao dizer não. Há os que defendem a idéia de que a criança tem o direito de argumentar, desde que isso não signifique, por exemplo, horas de discussão sobre a necessidade do banho. Ainda assim, os argumentos infantis têm limites, assim como a paciência dos pais. Se por falta de tempo ou por qualquer outra razão houver um “não e ponto”, não há dramas, desde que tenham refletido sobre a validade da negativa. Porém, para a manutenção do respeito recíproco, deve-se dizer à criança que a decisão foi tomada, será mantida, mas que o assunto pode ser retomado mais tarde. “Aliás, no capítulo dos limites, cumprir promessas é outra lição importante. Quem esquece promessas, esquece castigos.” (Lidia Aratangy).

Quando o assunto é limite, coerência faz toda a diferença, sempre. As cianças não entendem, até certa idade, o que significa a expressão “de vez em quando”, qualquer que seja a situação. Se o não vira sim de vez em quando, o limite torna-se elástico (Lidia Aratangy).

Os pais não percebem que impõem limites porque gostam muito dos seus filhos e não o contrário.” (Ceres Araújo).
A vida nos impõe limites a cada escolha que nos obriga a fazer. O aprendizado é menos doloroso quando os pais ensinam os filhos a fazer renúncias, já que não se pode ter tudo. ” (Lidia Aratangy).

(Texto extraído de matéria da revista CRESCER em FAMÍLIA – EDIÇÃO DE ABRIL/98 – PGS 61 A 63 – Tatiana Petit).

Crise de perda de fôlego

Quem já presenciou uma, nunca esquecerá. A sensação é de que a criança vai morrer mesmo. Ela começa chorando, vai jogando o ar para fora, após alguns segundo não inspira mais, fica toda roxinha, amolece, parece que desmaia, cai, adormece e após algum tempo acorda como se nada tivesse acontecido.

As perdas de fôlego em crianças têm sido objeto de preocupação há muito tempo. A primeira descrição de uma crise é atribuída a CULPEPER (citado por LIVINGSTON) no século XVIII.

Essas crises ocorrem mais frequentemente em crianças entre 6 meses e 3 anos, aumentam com a idade, chegando a 4 a 5 vezes ao dia, desaparecem por volta dos 5 anos e são, na verdade, acreditem ou não, “crises de birra”.

Essa “catástrofe” acontece, normalmente, nas primeiras vezes, após uma contrariedade, por menor que ela seja. Pode ser porque a criança cai, por um susto, por ser contrariada, porque alguém tirou um brinquedo da mão dela, etc. (olha ele aqui de novo e põe etc. nisso). Podem ocorrer crises mais severas, seguindo o mesmo script, e a criança perde a consciência, tornando-se rígida e assumindo a posição em opistótono (fica esticadinha arqueando o corpo para trás).

Mas até termos certeza do diagnóstico de “birra” precisamos afastar outras possíveis causas (cardiológicas, neurológicas, hematológicas) de crises de cianose (ficar “roxinha”).

Segundo alguns estudiosos no assunto, este quadro acontece em crianças super-protegidas e muito mimadas, que não conseguem trabalhar uma frustração de forma sadia.

A grande dificuldade, para quem não presencia a crise e não conhece a criança e sua dinâmica familiar, é diferenciar a crise de perda de fôlego de uma crise convulsiva (epilepsia).

Pela seqüência dos sintomas, podemos ter uma forte suspeita da perda de fôlego:

1. Presença de fator precipitante representado por estímulo emocional e/ou doloroso.
2. Choro, de duração curta.
3. Parada respiratória na fase de expiração.
4. Cianose (roxinho) ou palidez, usualmente perilabial.
5. Rigidez generalizada (opistótono), com perda de consciência.
6. Movimentos convulsivos clônicos.

Por outro lado, se for um quadro de epilepsia, a ocorrência dos ataques é espontânea, sem um fator precipitante aparente. O choro, antes do ataque epiléptico, nem sempre aparece; a cianose, se presente, aparece depois do início dos movimentos convulsivos e, finalmente, o opistótono é ocorrência rara.

E o que fazer na hora da crise?
Tentem manter-se tranqüilos, sem deixar a criança perceber que a situação preocupa a família. Quando a criança percebe que a crise de perda de fôlego chama a atenção de todos, inconscientemente, passa a ter mais crises. Segundo alguns psicólogos, o mais adequado é deixar o bebê sozinho, vigiando às escondidas e não acalentá-lo tão logo cesse a crise. Não adianta assoprar o nenê.

Para o tratamento da “crise de perda de fôlego” deve-se visar principalmente uma orientação psicológica para adequar as relações entre os pais e a criança, pois na grande maioria dos casos, distúrbios de conduta formam a parte integral do problema. Lembre-se que:

1. As crises, por piores que possam parecer, não deixam seqüelas nem provocam morte;
2. A tranqüilidade de todos perante a crise, por mais difícil que seja, é fundamental;
3. As crises só desaparecem com o passar do tempo.